Há quase 10 anos, especificamente em dezembro de 2012, alguns direitos das pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) passaram a ser assegurados pela Lei nº 12.764, batizada de “Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista”. Basicamente, a legislação reconhece que os autistas têm os mesmos direitos de pessoas com deficiência. Contudo, o acesso ao tratamento integral de caráter multidisciplinar ainda não tinha sido conquistado por usuários de planos de saúde ou muito menos para quem depende do Sistema Único de Saúde (SUS). Felizmente, novas legislações têm mudado essa realidade. O problema é que nem todas as operadoras de saúde ou entes públicos estão dispostos a obedecer à lei. Nesses casos, recorrer ao Poder Judiciário acaba sendo a única forma de garantia do tratamento.
Desde setembro deste ano, quando a Lei nº 14.454/2022 foi publicada no Diário Oficial da União, o chamado “rol taxativo” para a cobertura de planos de saúde foi derrubado, o que significa que as operadoras de assistência à saúde podem ser obrigadas a oferecer cobertura de exames ou tratamentos que não estão incluídos no rol de procedimentos previstos pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Recentemente, os planos de saúde até tentaram derrubar esta Lei, mas o pedido não foi acolhido pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Assim, se a prescrição do médico assistente cumprir a pelo menos uma das condicionantes listadas na referida Lei, os planos são obrigados a cobrir sessões ilimitadas de fonoaudiologia (com ou sem integração sensorial), fisioterapia, terapia ocupacional, psicologia, neuropsicologia, equoterapia, psicopedagogia, natação funcional e outras terapias, como a ABA e o Método Denver.
De acordo com a advogada Marina Basile, pioneira em Direito à Saúde na Bahia, para que as operadoras ofereçam cobertura de determinado tratamento para pacientes autistas, é preciso que ele atenda pelo menos um dos seguintes critérios: ter eficácia, à luz das ciências da saúde, baseada em evidências científicas e plano terapêutico; ter recomendações da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec); ou ter recomendação de, no mínimo, um órgão de avaliação de tecnologias em saúde que tenha renome internacional.
“Muitas são as famílias de pacientes autistas que me procuram para garantir tratamentos multidisciplinares que atendem a esses condicionantes. Embora a nova lei tenha facilitado a relação entre o consumidor e os planos de saúde, para muitos usuários a judicialização ainda é necessária. Nesses casos, a informação especializada, adequada e precisa é o melhor caminho em direção ao restabelecimento dos direitos violados”, destacou a consultora jurídica sócia do primeiro escritório baiano de advocacia a integrar o Metaverso.
O autismo é mais comum em crianças do que AIDS, câncer e diabetes juntos. Segundo o Center of Diseases Control and Prevention (CDC), órgão do governo dos Estados Unidos, a cada 110 crianças, uma é autista. No Brasil, estima-se a existência de 2 milhões de pessoas com TEA e no mundo, segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), há mais de 70 milhões de pessoas com autismo. A incidência em meninos é maior: a relação é de quatro meninos para uma menina. Diversos estudos comprovam que o diagnóstico precoce e a adequada intervenção prematura são fundamentais para assegurar mais qualidade de vida às pessoas com autismo. Contudo, apesar de numerosos, os milhões de brasileiros autistas ainda sofrem para encontrar tratamento adequado.
Nem mesmo o acesso à Carteira de Identificação da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista (Ciptea), criada em 2020, está garantido para todos os autistas brasileiros. O documento que prevê direitos aos indivíduos com autismo, implementado através da Lei nº 13.977/20 e batizada de Lei Romeo Mion, ainda não está disponível na Bahia. A legislação estabelece que, mediante a apresentação da Ciptea, o autista tenha prioridade no atendimento e no acesso aos serviços públicos e privados, em especial nas áreas de saúde, educação e assistência social. “Mesmo sem a carteira, os autistas da Bahia devem ter seus direitos assegurados, nem que para isso seja preciso recorrer ao Poder Judiciário. Lei existe para ser cumprida”, finalizou Marina Basile que, com atuação em todo o território nacional, já ofereceu assessoria preventiva, consultiva ou contenciosa para mais de 12 mil clientes, contabilizados os atendimentos remotos.
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