Meu nome é Luciana Carvalho Azevedo, sou natural de Salvador-Ba, 25 anos, estudante de Serviço Social e mãe de santo de Umbanda.
Eu vim de uma família simples e desestruturada mentalmente e psicologicamente, a minha mãe biológica era usuária de drogas e não tinha condições nenhuma de me manter, então abriu mão da minha guarda para a minha avó paterna, quem eu convivo e vivo desde os meus 4 meses de vida. Quando a minha avó ficou ciente de que eu era uma criança com necessidades especiais, começou a procurar ajuda médica no Hospital Sarah, onde fui diagnosticada com Síndrome de Moebius aos 4 meses de vida, fiz tratamento na instituição até os meus 14 anos, quando fiz uma cirurgia para correção dos dois pés tortos congênitos, a qual tive uma parada respiratória e não conseguiram finalizar a cirurgia, quando completei 15 anos, fizemos mais uma tentativa cirúrgica e finalmente, deu certo a correção do pé esquerdo e após os meus 15, realizei a cirurgia de correção do pé direito. Até então, eu estudava em uma escola do bairro da vila Laura e era uma escola que parecia ser inclusiva , porém isso não aconteceu. Eu sofri muita descriminação e preconceito por ser uma menina muito calada e quieta, tinha vergonha das minhas órteses que usava após ter feito as cirurgias e ia sempre com uma calça para cobrir a minha identidade. A minha história pessoal é interligada a minha espiritualidade por que eu nunca deixei de acreditar em Deus, nunca abandonei a minha fé diante das dificuldades e diagnósticos médicos. A minha avó me ajudou muito nisso, nunca deixou de acreditar em meus sonhos e muito menos em meus projetos de vida.
Em meio tanta turbulência, aos 17 anos fui em busca da espiritualidade, em busca do que realmente faltava em minha vida aqui na terra como um espírito, fui buscando estudar a Umbanda, buscando aprender mais sobre esse universo paralelo que chamamos de espiritualidade. Me aperfeiçoei as cartas ciganas e fui aprendendo conforme ao tempo, a minha intuição nunca falhou, sempre auxiliando nas minhas cartadas em mesa, no primeiro ano, 2016 que comecei a jogar para as pessoas sem cobrar, pois estava apenas começando no ramo da cartomancia! Eu não precisei de tomar aulas ou ler livros para aprender a jogar as cartas, simplesmente a minha intuição alinhada com a espiritualidade que me acompanhava, sem eu saber disso… é claro! Logo depois foi surgindo em mim uma necessidade de buscar mais informações, novos horizontes e tinha um vazio dentro de mim , foi quando conheci a minha primeira casa de Umbanda que se localizava na ladeira dos galês, em salvador. Fui e conheci pela primeira vez a Umbanda, a minha queridíssima e amada Umbanda. Foi acolhedora demais comigo! Quem me abraçou e me deu boas-vindas foi uma querida preta velha Maria Conga, quem eu desfrutei de suas palavras acolhedoras e de fácil entender, eu disse a ela que queria entrar nessa religião e ela já sabendo de tudo, disse que era um percurso difícil mas que eu iria vencer. Aquela casa era perfeita, porém eu queria sempre mais, faltava mais e assim, conheci uma outra casa de Umbanda onde eu frequentei por 2 anos e meio, me batizei e desenvolvi a minha mediunidade, porém nesses 2 anos percebi muitas coisas erradas e inclusive, a descriminação pelo fato de eu ser uma mulher com Deficiência. Me tratavam como “aquela menina deficiente”, nunca me esqueço daquela cena. Chegava em casa chorando, agoniada e sem esperanças de nada, entrava mau e saia mais ainda daquela casa. Então eu resolvi parar, resolvi me dar um tempo e esperar o tempo passar por que só ele cura, só ele regenera a nossa alma e faz o nosso físico entender o que se passa.
Quando estava em uma rede social e conheci uma mãe de santo de candomblé, ela era muito dócil, falava com muita educação, gostava de mim e eu também gostei muito dela, resolvemos fazer um jogo de búzios, onde a mesma me disse que eu tinha que fazer o santo, ela me daria um ebó e não iria cobrar pelo trabalho. Não cobrou o ebó, bori, nem nada, somente o que realmente eu iria usar no dia. Aos poucos ela foi conquistando a minha confiança e de minha mãe-avó, assim aconteceu, fiz o bori e a minha cabeça virou do avesso, falei com ela do que estava acontecendo e ela disse que Iemanjá estava agoniada pela minha feitura e assim , fiz o santo. Fui iniciada no culto afro, nação Keto, foi difícil esse processo por que todos achavam que eu não tinha que ser iniciada por que me caracterizavam como “doente” e que não tinha condições nenhuma de direcionar o meu espíritual mas não precisava deles, apenas precisava de Iemanjá para me sentir um pouco mais completa. Fiz tudo o que tinha que ser feito, eu ainda sentia que não era o que realmente eu precisava. Foi quando eu tive uma discussão com a própria e decidi sair da casa, fui perseguida de todas as formas espiritualmente e foi quando eu dei a minha obrigação de 1 ano em outra casa de candomblé. Minha Padilha disse a mim antes de tudo “você tem todo direito de fazer o que quer, mas a gente não quer que você faça” , mesmo assim dei a minha obrigação de 1 ano para aliviar tudo o que estava acontecendo comigo. Passaram-se alguns dias e aconteceu um episódio que é difícil para mim falar sobre isso sem me sentir agredida. Pois, essa mesma Padilha me enradiou e me levou até a casa de candomblé a que eu dei a minha obrigação. Sai de lá, arrasada, sentei na escada que tinha lá naquela casa e chorei, chorei muito perguntando para Deus o por que daquilo acontecer comigo e eu ouvi uma voz “Você tem que ser forte, levante e vá embora”, peguei 3 sacolas grandes cheias de igbas, porcelanas de orixá e vim para minha casa. Nessa noite, minha avó estava em viagem e não percebeu nada, quando ela chega em casa, se depara com o quarto interditado cheio de santo. Após isso, resolvi parar com tudo e me dedicar a minha faculdade, as minhas coisas e o tempo foi passando, passando e ainda ficava esse vazio, foi quando boiadeiro Zé do Laço veio em terra e falou para minha avó “filha, está na hora de trabalhar, a senhora veio aqui com ela por que escolheu, respeite a missão dela, você ainda vai ajudar muito nisso”, foi quando surgiu a minha casa de Umbanda , Amor fé e Caridade. Aprendi com isso, de que nem sempre precisamos de alguém para nós completar e sim, obedecer a nossa espiritualidade e que tudo tem o seu denominador comum, tudo existe o seu por que e sua causa. Hoje, eu sou feliz e completa, não sinto falta de absolutamente nada na minha vida, aprendi após isso, respeitar o meu passado por que sem ele, não estaria vivendo o presente! Agradeço a Deus e aos meus guias, em especial a dona Farrapo que sabia de tudo e soube fazer tudo para me colocar no caminho certo. À seu boiadeiro Zé do Laço por me guiar e ser líder dessa casa. Sou mulher PCD, estudante, luto pelas causas sociais e mãe de santo de umbanda, sim! Com orgulho e determinação. Axé !
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